Era uma vez, uma vestimenta que surgiu para aquecer o corpo, dar proteção e segurança. Feita de couro bruto, ela tinha função clara e necessária.
Depois passou a ser questão de status e divisão, ferramenta de controle e mulheres sufocadas por espartilhos. A vestimenta não era mais uma questão de escolha, era símbolo de dominação e subserviência. A divisão de classes se concretizava.
Com o passar do tempo; batalhas vencidas, a vestimenta se torna um instrumento de luta contra o sistema, exclusão e conservadorismo. A moda se torna objeto de protestos! Trocando amarras, quilos de saias rodadas, camadas de vestimentas por vestidos retos e soltos, saias até os tornozelos e mais tarde por calças. As peças eram artesanais, produzidas por costureiros renomados, em máquinas simples e por donas de casa em máquinas caseiras. Ambas podendo ser até costuradas a mão.
Em 1906, Paul Poiret liberta as mulheres das amarras dos espartilhos por ligas e soutiens.
Em 1947, Chistian Dior surge com o Tailleur, com saia plissada e blazer acinturado.
Mais tarde Coco Chanel o tornou mais prático, versátil e popular levando-o às passarelas.
Em 1965, a moda se junta a arte, levando peças mais amplas com recortes em tons contrastantes as passarelas por Yves Saint Laurent.
E voltando um pouco na história, em 1792 é criado o tecido Denim (nosso conhecido jeans), em 1873 Levi Strauss e Jacob Davis patentearam a calça jeans, o popularizaram criando a calça reforçada com rebites, a five pockets, usada como uniforme pelos mineiros. Com a passagem do tempo, em 1976 Calvin Klein leva a calça jeans para as passarelas, fazendo ela se transformar no que é hoje, uma peça presente em praticamente todos os guarda-roupas, não importando a idade, região, cultura ou classe social, ele se apresenta em diversas maneiras, espessuras, ganhando novas versões constantemente. Acessível a toda pirâmide.
As peças do vestuário carregavam histórias, qualidade e durabilidade. Feitas pra durar! Muitas vezes verdadeiras obras de arte, peças únicas. Reflexo da cultura de cada momento. Tanto produzidas por costureiros famosos quanto pela costureira da cidade. Hoje elas ainda existem, mas são poucas. Na grande maioria se tornaram apenas mercadorias em pequena ou larga escala, sempre buscando alto lucro e supervalorização das marcas. Uma gerra comercial.
A china está aí para provar que a mesma peça, feita com o mesmo material e mesma qualificação de mão de obra sem as famosas etiquetas, pode ser produzida por uma fração do preço comercializado. Como a famosa bolsa italiana, Birkin, da Hermes. Ela existe em varias versões e seu preço varia de US$ 2,000 a US$ 432,000,00 no seu modelo Birkin Himalayan Crocodile. Garantindo materiais e fabricação exclusiva.
Africanos da Nigéria dizem já ter provado na justiça, que há trinta anos fabricam o mesmo couro utilizado nas bolsas da Hermes. E parece que alguns clientes entraram na justiça com a acusação que a marca só vende determinados modelos de bolsas Birkin, apenas para clientes com longo histórico de compras.
Existe também a indústria que produz peças com qualidades questionáveis, pouca durabilidade e produzindo novas “modas” a cada troca de estação, carregadas de marketing, muitas vezes duvidoso. Essa é a indústria do lixo, que também deixa rastros de destruição. Tornando-se assim um problema ambiental e social. Provocando um buraco sem fim de acumulo de lixo, adoecendo o planeta e deixando turvo o ar que respiramos.
Sentir-se parte do todo, nem mais e nem menos, é um desafio existencial. O descolamento da dependência das telas, das grandes marcas; dessa sociedade, mídia e indústria que tentam nos impor o que é moda e bom comportamento, é desfiador. A moda padronizada, a aparência padronizada é o esvaziamento intelectual. Uma formação de discípulos. É parte da desumanização, manipulação das mentes, fortalecimento do ego e a destruição da identidade de muitos, para o lucro de alguns. O maior lucro possível. O que está acontecendo no mundo, onde pessoas morrem de fome, frio, guerras e outras estão na fila para comprar bolsas de 432 mil dólares?